Canabidiol é um tema muito polêmico, em que ainda não existem verdades absolutas. Há muita expectativa e alguns resultados reais nas pesquisas que já estão sendo realizadas.
Apesar de toda a publicidade em torno do CBD e de como ele pode ajudar no tratamento de algumas doenças, ainda existe muita dúvida em relação ao quanto ele pode ajudar e em quais casos ele pode ser útil.
Neste segundo artigo sobre o uso do CBD, Dr Diego de Castro, Neurologista e Neurofisiologista pela USP, explica o que já temos de evidência do efeito desse medicamento no tratamento de diversas condições neurológicas.
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Na USP Ribeirão Preto, o canabidiol já é estudado desde a década de 70, aproximadamente, na área da Psiquiatria, especialmente para tratamento da depressão refratária e esquizofrenia, em quadros bem mais graves, intratáveis.
Com os resultados obtidos nessa área, houve uma motivação em começar a pesquisar seus efeitos nas doenças neurológicas.
Artigo publicado no Molecules aponta que o uso terapêutico de extratos de canabinoides já é prescrito:
Em 2014, a USP Ribeirão Preto realizou um estudo com pacientes de Parkinson. O estudo foi duplo-cego, ou seja, nem os pacientes nem os médicos sabiam quem estava tomando canabidiol ou placebo. Todos os pacientes continuaram tomando sua medicação habitual para Parkinson. Ou seja, o canabidiol foi acrescentado aos medicamentos ingeridos.
Na avaliação antes/depois foi constatado que os pacientes nos dois grupos apresentaram melhora. No entanto, alguns pacientes do grupo que utilizou canabidiol melhoraram de forma extrema.
Esses resultados nos mostram que algumas pessoas respondem muito bem ao canabidiol. Mas ainda não sabemos o que essas pessoas têm de diferente que faz com que elas respondam tão bem ao canabidiol. Ou seja, qual é o perfil de pacientes que pode se beneficiar desse princípio ativo.
Por este motivo, ainda não consideramos o canabidiol como primeira escolha para o tratamento de todos os pacientes com Parkinson. Ainda não há como saber com exatidão se o paciente apresenta o perfil daqueles que respondem bem a este medicamento.
Outro aspecto interessante do estudo foi a avaliação do grau de satisfação do paciente com o tratamento. Ao avaliar o fator "impressão global do paciente", uma escala onde o paciente relata seu nível de bem-estar com o tratamento, grande parte dos pacientes relataram se sentir melhor.
Esse aspecto pode ser um dos fatores que explica porque o canabidiol está ganhando tanto destaque. O nível de bem-estar mais alto está relacionado a uma sensação de melhora.
Como o THC é responsável por uma sensação de euforia, poderia explicar o bem-estar dos pacientes. Mas é importante destacar que o canabidiol utilizado neste estudo era 100% livre de THC.
Algo muito relevante que este estudo nos trouxe é que ainda não é o momento de depositar todas as fichas no canabidiol, já que ainda não temos o embasamento científico para saber com certeza qual é o paciente que pode obter melhoras em seu quadro usando esta substância.
Além disso, ainda existe muita dúvida em relação à dose que pode realmente fazer algum efeito terapêutico para o paciente. Neste estudo, foram administrados 300mg do canabidiol. Apenas como comparação, para casos de dor crônica, utilizamos em torno de 25mg, com base na literatura que já existe a respeito.
Aos poucos, com a realização de diversos estudos, é possível ajustar a dose efetiva. Por exemplo, a levodopa hoje em dia utilizamos o comprimido de 200mg, mas logo no início da utilização desse medicamento, a dose era 10mg. Naquela época, havia muitas dúvidas sobre a eficácia da levodopa, mas na realidade, era a dose que ainda precisava ser ajustada.
Quando foram identificados os efeitos do sistema endocanabinoide modulando a neurotransmissão envolvida na função motora, particularmente dentro dos gânglios da base, a ideia é que o canabidiol seria uma substância útil no tratamento dos distúrbios do movimento.
Entretanto, nos estudos realizados com pacientes de distonia, os resultados obtidos foram muito parecidos com os de Parkinson: houve pouca diferença nos resultados do grupo canabidiol e do grupo placebo.
Ainda é necessário realizar mais estudos para compreender como o CBD pode beneficiar pessoas com distonia.
O maior estudo realizado com pacientes com Huntington teve 26 pacientes. Os pesquisadores chegaram até a dose de 1500mg de canabidiol diários, para identificar os efeitos e tentar identificar a segurança de uma dose tão alta.
Também não houve diferença entre os pacientes do grupo canabidiol e do grupo placebo nas escalas de movimentos involuntários, qualidade de vida, entre outros aspectos, apesar de a segurança e a tolerabilidade serem confirmadas.
Somente foi relatado um efeito sobre a irritabilidade. Os pacientes ficaram mais calmos, algo que também é importante nesta doença, já que os sintomas psicóticos são comuns.
Conforme estudo publicado na Frontiers in Neurology, a combinação do THC com o canabidiol ajuda a relaxar a musculatura, tendo efeito em reduzir a espasticidade. Isso ajuda a reduzir a dor nesses pacientes, facilitando a caminhada.
Por esse motivo, estamos buscando testar o canabidiol nas doenças que têm a espasticidade como sintoma. Por exemplo a Doença de Machado Joseph (ataxia espinocerebelar tipo 3) e a Esclerose Múltipla.
O problema em que esbarramos nesta situação é o custo do medicamento, que precisa ser utilizado por alguns meses antes de identificar seus efeitos, já que precisamos aumentar a dose aos poucos, para não causar efeitos adversos, como as alucinações. Além disso, o canabidiol não tem efeito sobre o curso da doença e não trata outros sintomas.
Os trabalhos de pesquisa na epilepsia foram realizados com pessoas que tinham um número muito alto de crises por dia. Este artigo, também publicado na Frontiers in Neurology, resume um histórico dos estudos realizados em diversas síndromes de epilepsia, demonstrando os efeitos positivos do canabidiol em grupos específicos de pacientes, especialmente em tipos mais raros e agressivos da doença.
Por este motivo, a prescrição do canabidiol na epilepsia já é algo mais consciente, devido aos resultados mais palpáveis obtidos. Mas é importante deixar claro que não é para todos os pacientes, ou mesmo para alguém que apresentou apenas uma convulsão.
É necessário fazer uma análise adequada do caso, para identificar se o paciente possui as características dos quadros que respondem bem ao canabidiol.
Especialmente nesses casos, é importante lembrar que o uso do canabidiol não altera o curso da doença, ou seja, não vai reverter ou impedir o desenvolvimento da demência e também não vai ter efeitos na melhora da memória.
Os efeitos positivos relatados do uso do canabidiol nas demência são em relação aos quadros depressivos, de agitação e mesmo de apatia ou perda de apetite.
Um relatório da Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health sugeriu que a cannabis medicinal pode ser eficaz para o tratamento de sintomas neuropsiquiátricos associados à demência, como:
Por exemplo, para os pacientes que precisam de um certo incentivo para realizar suas tarefas diárias, devido ao grau de apatia já estar bem elevado, já existem relatos de uma melhora, especialmente se no medicamento também estiver presente o THC (em uma quantidade mínima).
Mas é importante ter cuidado no tratamento do Alzheimer com o canabidiol, pois estes pacientes têm uma grande possibilidade de apresentar alucinações. Então é necessário avaliar bem o histórico do paciente e o suporte familiar que ele possui, além de um acompanhamento de perto após o início do uso, já que mesmo com doses baixas, é possível desenvolver quadros mais graves de alucinações.
Uma das evidências já bem estabelecidas é o efeito do canabidiol na dor. Especialmente a dor refratária, que não responde a outros medicamentos e também a dor neuropática. Quando o paciente obtém uma resposta ao medicamento, há uma grande melhora em sua qualidade de vida.
Na dor neuropática (em quadros que comprometem a integridade do nervo, gerando quadros de dor muito intensa), o uso do canabidiol parece diminuir a atividade neuronal que transmite a sensação de dor para o cérebro.
Nos casos de dor crônica, o canabidiol parece agir nas regiões cerebrais relacionadas à interpretação do estímulo doloroso, diminuindo a informação da quantidade de dor. Um estudo publicado na Practical Pain Management apoia o uso da cannabis medicinal, sob a supervisão de um profissional de saúde, como opção de tratamento segura e eficaz para dor crônica e melhor qualidade de vida.
Além disso, o "potencial viciante" do canabidiol é muito menor, comparado ao dos opioides. Por este motivo, nos quadros de dor, acabamos dando preferência ao canabidiol na hora de prescrever o medicamento, ao contrário do que acontece com as outras condições neurológicas.
A Miastenia gravis é uma doença que compromete o sistema nervoso periférico, mas não há comprometimento na integridade do nervo.
Por este motivo, ainda não há indicação do uso de canabidiol para pacientes com Miastenia, já que ainda não foram identificados efeitos da substância nos sintomas da doença.
É importante considerar que o canabidiol não trata a doença em si. Ele pode ajudar a tratar os sintomas de algumas doenças. Mas ele não interfere na sua evolução.
Por exemplo, para pacientes com Parkinson precoce, com idade de 40 anos, a Estimulação Cerebral Profunda apresenta resultados excelentes. Essa já é uma forma de terapia bem estabelecida, com respaldo na literatura. Por esse motivo, damos preferência a este tratamento, ao invés do canabidiol, que ainda se está pesquisando qual é o subgrupo de pacientes que responde bem ao tratamento.
Neste momento, utilizamos o canabidiol em casos que outras terapias já estabelecidas foram tentadas e não surtiram efeito.
Diversos estudos na literatura científica já comprovaram que o uso da cannabis, a planta em si, causa efeitos psiquiátricos na faixa etária juvenil. Efeitos psicóticos, alucinações, e ideação suicida, por exemplo, são observados, não devido ao canabidiol, mas devido aos outros canabinoides (THC, terpenos e outros compostos na planta). A qualidade da extração do canabidiol é importante para garantir que esses compostos não estarão presentes no medicamento.
Também é importante lembrar que usar a planta cannabis, ou mesmo o extrato de maconha, não é o mesmo que usar o canabidiol.
Em resumo, ainda temos um grande campo de pesquisa em relação ao canabidiol, especialmente quanto à dose, perfil de segurança e real benefício da medicação.
Neste momento, acreditamos que seja uma substância muito promissora, mas ainda não é algo que tem efeito para todos. São necessários, ainda, muitos estudos, para definirmos suas reais utilidades.
Para saber mais sobre os efeitos do canabidiol e os cuidados que precisamos ter em relação ao seu uso, leia nosso artigo: "Tratamento com Canabidiol - Conheça os Efeitos e Cuidados em Seu Uso".
Dr Diego de Castro é Neurologista e Neurofisiologista pela USP especialista em Doença de Parkinson e Distúrbios do Movimento. Também é membro da Academia Brasileira de Neurologia (ABN) e da Sociedade Brasileira de Neurofisiologia Clínica (SBNC). Cuida de pacientes com Parkinson e condições neurológicas raras. Também disponibiliza informações para pacientes e familiares. Leia nossos artigos:
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Dr. Diego, minha irmã tem 30 anos e recentemente foi diagnosticada com LEUCODISTROFIA. Estamos em busca de um tratamento onde possa trazer algum beneficio. Vi que o sr. trata de diversos temas, gostaria de saber se o tratamento com Canabidiol poderia ajudar. Vamos passar ela em um neurologista semana que vem, mas gostaria de ter uma ideia, para sugerir ao medico.
Olá Paulo, há mais de 70 genes causadores de leucodistrofia. E do total de pacientes que fazem o teste genético apenas 30% dos casos tem gene identificado. O canabidiol pode ser considerado de acordo com o caso, tipo de mutação e presença de contraindicações.
Boa noite Dr fui diguinosticada com amiloidose sistêmica mas só tenho a doença na pele e sou diabética e sinto uma dor nas costas e vai para o lado esquerdo me deixando tonta e muita dor quando tomo alprazolan fico bem passa o efeito começa tudo outra vês e sou muito anciosa será carnabidiol daria certo como tratamento desde de já obrigada
Olá Nacionara, o canabidiol pode ajudar pacientes com dores de origem neuropática. Para saber se voce se enquadra nessa indicação só mesmo em uma consulta. Caso tenha interesse, estou atendendo online. Entrar em contato no whatsapp 27 99707-3433
Abraço
Diego de Castro
Gostaria muito de conversar com doutor diego a respeito do meu quadro
Olá Luciano! Caso precise de uma avaliação para uso de canabidiol em doenças neurológicas atendemos presencial em São Paulo e online para todo Brasil. Para consultas online enviar whatsapp para 27 99707-3433
Abraço e Boas Festas!
Dr, boa tarde!
o canabidiol pode ser utilizado por quem tem TDAH e ansiedade?
Meu filho faz tratamento oncológico, ele tem 2 anos, tem tumor de vias óptica grau 3 e esta tendo convulsão e uns escapes.
Pode usar canabidiol
DR. Diego de Castro, Boa Tarde
Minha esposa tenho 46 anos e foi diagnosticada há aproximadamente a 08 anos com Ataxia ( ARSACS ), pela equipe de Ataxia do Hospital São Paulo, atualmente ela deixou de andar sozinha apenas com ajuda e cadeira de rodas devido a evolução da espasticidade.O Canabidiol pode ser um aliado para melhora desta situação, principalmente do andar?
Olá Ricardo, ARSACS é uma doença neurológica rara que causa ataxia e um fenomeno de enrijecimento nas pernas chamado espasticidade. Pode produzir outros sintomas neuorlogicos dependendo do individuo. Se sua esposa parou de andar pela perda do controle de tronco e desequilibrio o canabidiol não vai ajudar. Se o sintoma principal for espasticidade o canabidiol tem o potencial de ajudar. Converse com seu neurologista para ele avaliar qual dos 2 sintomas é o responsavel pela limitação motora.
Meu esposo foi diagnosticado com síndrome de ausência.
Toma tegretol cr 200 3x ao dia há vários anos. O canabidiol pode ser o substituto do medicamento acima.
Dr. Diego,
Meu filho é Autista Severo, seria indicado para ele??
Olá Dr. Castro. Tenho um primo de 18 anos que tem diagnóstico de paralisia cerebral. Porém sua família tem dificuldades com sua espasticidade, pois ele não anda e, com frequência se machuca por acidente. Gostaria de saber se o tratamento à base de canabidiol funciona nesses casos e qual seria a melhor maneira de avaliar?